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DISCALCULIA: A BUSCA DO TEMPO CERTO


Um dos problemas com que nos deparamos em nosso trabalho cotidiano junto às dificuldades no aprendizado de Matemática é a Discalculia.

Objeto de muitas especulações – as quais vêm do considerável desconhecimento do tema, por tratar-se de matéria muito recente no campo da educação matemática -, tem se tornado mais um ponto de divisão entre educadores e profissionais ligados a educação, psicopedagogia e neurologia. Aspectos de seu diagnóstico, bem como de seu tratamento, têm sido abordados de muitas maneiras diferentes, o que faz com que pais e professores de alunos supostamente portadores desse distúrbio sintam-se perdidos. O problema, entretanto, pode estar, não especificamente na falta de conhecimento sobre o tema, mas na compulsão de se chegar imediatamente às respostas que conduzam a diagnósticos e tratamentos adequados. Não custa lembrar que vivemos na sociedade do imediato, onde tudo parece demandar respostas rápidas e procedimentos precisos. Vivemos, hoje, talvez, a ilusão de eficiência e competência sempre associadas ao tempo em que se realizam as ações, muito mais do que aos seus resultados mais perenes. Além do quê, nessa pressa com que tratamos tudo, nem sempre é possível relacionar resultados encontrados hoje com procedimentos usados em tempos mais remotos. A discalculia, por tratar-se de um distúrbio de origem neurológica, só se apresenta de fato à medida que o processamento das informações recebidas pelo indivíduo vai se mostrando insuficiente ao longo de sua vida. Em outras palavras, só é possível que se perceba traços desse distúrbio a partir da variação dos níveis de maturação neurológica - compatíveis com as demandas que a Matemática pode apresentar nas diferentes fases do aprendizado. Não se trata, portanto, de um distúrbio que se percebe da noite para o dia. Seu acompanhamento e busca de diagnóstico implica numa investigação cautelosa e multidisciplinar, desde as primeiras etapas da alfabetização. Já nos primeiros anos da educação infantil, é comum encontrarmos situações de dificuldades em Matemática, que não evoluirão necessariamente, sendo desta forma consideradas apenas dificuldades escolares. E mesmo que evoluam, podem estar no nível que antecede o que podemos caracterizar como distúrbio. O fato é que a atenção de educadores e familiares sempre é algo indispensável nesses casos. Frente às avaliações escolares com resultados insatisfatórios, nos primeiros anos, mais do que desdém ou algum tipo de desespero, a atitude mais correta é a observação e o diálogo entre as partes. Família e escola podem tratar os problemas de maneira muito tranquila se não se partir para as atitudes imediatistas. No caso da discalculia, distúrbio que se caracteriza por grandes dificuldades – como dissemos, e oriundos de disfunções neurológicas – para se trabalhar com quantidades, símbolos matemáticos, para se fazer contagens e comparações, podendo evoluir para a incapacidade de ler números, realizar operações e, consequentemente, inviabilizar a construção dos conceitos básicos e avançados, o diagnóstico é bastante complexo. E isto por razões evidentes. Tais dificuldades podem estar associadas a outros fatores. A influência familiar, o ambiente escolar, as relações com colegas e professores, dificuldades visuais e auditivas podem provocar problemas como os citados, sem que o indivíduo seja necessariamente discalcúlico. A presença de outros transtornos – como, por exemplo, dislexia, TDAH etc – podem também levar o aluno a manifestar sintomas que, se analisados prematura ou superficialmente, acabam por determinar equívocos por vezes irreparáveis. É preciso, portanto, que se tenha cuidado e não há outro caminho que não seja a informação e a busca de diálogo com quem se dedica a esse tipo de problemas no dia-a-dia. E não basta tratar isoladamente com um profissional especializado em Educação Matemática ou simplesmente consultar um psicopedagogo, para que se possa fazer um diagnóstico preciso. A discalculia envolve uma série de fatores que só podem ter um sentido se analisados multidisciplinarmente. Daí, o tempo e a dedicação maiores que os esperados para que se possa tratar coerentemente as suspeitas. E, uma vez reconhecida a discalculia, outra batalha começa a ser travada. A luta pelo “resgate” do que se perdeu e a busca quase insana por resultados imediatos. Os profissionais são cobrados por família, escola e pelo próprio discalcúlico, pois existe um anseio pela solução eficaz e rápida do problema. Outra demanda frequente é pela reintegração completa do estudante junto ao grupo, quase que magicamente, como se, a partir do tratamento, este já estivesse em condições de alcançar o nível da maioria. Devemos nos lembrar que o ser humano desenvolveu a mensuração do mundo, os estudos das formas e dos números a partir do equipamento intelectual, psicológico e neurológico que possui. Se há diferenças no instrumental neurológico de certos indivíduos, que o impeçam de lidar com quantidades, relações, comparações etc, esses deverão compensá-las ou criar novos caminhos. É um equívoco muito grande pensar-se que um discalcúlico poderá fazer matemática como alguém que não apresenta esse distúrbio. O próprio tratamento consiste numa busca de caminhos alternativos àquilo que o estudante recebeu ao longo da sua vida escolar – e que, obviamente, não funcionou. A vida do portador de discalculia pode ser muito feliz e produtiva, inclusive com a possibilidade de realizar estudos e trabalhos que dependam da Matemática. Entretanto, este construirá – amparado pelos profissionais que o auxiliarem – caminhos e métodos seus, a partir da realidade que vivenciar e da dinâmica que puder constituir. E tudo isso dentro do tempo que for o melhor para si. O seu tempo!

*Publicado no Site: abcdislexia.com.br

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