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DEMOCRACIA - ESTAMOS POR UM FIO

Lendo as notícias dos últimos dias, deparei-me com dois assuntos muito sérios – e tristes, por que não dizer? Um deles foi o cancelamento da exposição Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira, que estava em cartaz há quase um mês no Santander Cultural, em Porto Alegre. O Santander cancelou a exposição após críticas nas redes sociais. O outro, a proibição do espetáculo "O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu”, na cidade de Jundiaí – estado de São Paulo -, pela Justiça da própria cidade. Em ambos os casos, o que contou foram motivos religiosos. Tanto no de Porto Alegre quanto em Jundiaí, a justiça acatou o que os descontentes – que certamente não foram a nenhum dos dois


eventos por razões óbvias – exigiram. Assim, o direito à livre expressão – de quem se manifesta e de quem gosta de apreciar temas de nossa época – foi solapado. Censura! Não consigo pensar em outra palavra para isto.

Enquanto, mais uma vez, ouvimos o silêncio indolente daqueles que formam a opinião em nosso país, o mundo comenta tais fatos como mais uma demonstração de que nossa democracia está na UTI. Velhas práticas, ligadas a um tempo triste que acreditávamos jamais poder voltar, vêm nos assaltar com a contundência de outras épocas. Razões religiosas! O monstro medieval parece jamais perder seu vigor. Contra ele não se brinca. Azar dos que sonham poder expressar pela arte seus anseios, temores e expectativas. Cancela-se, proíbe-se e tudo segue, como dizia Vinícius, “na mais perfeita ordem (...) na mais santa paz”.

Difícil separar tais fatos dos acontecimentos políticos envolvendo o governo brasileiro. Ao contrário do que pudemos ver desde as eleições de 1989, hoje os nossos governantes parecem não sentir que a nação mereça qualquer explicação sobre o que fazem. Políticos acusados são colocados em cargos do executivo para que desfrutem do foro privilegiado, magistrados escolhidos a dedo pelo próprio presidente que é alvo de um leque de denúncias, bilhões dados de presente pelo mandatário a fim de que as denúncias contra si sejam arquivadas, a velha cara de pau (igualzinha à dos tempos da última ditadura). Direitos, democracia? Somente para alguns. Só que antes havia canhões pelas ruas. Hoje, não! Tudo é feito com a tranquilidade de quem sabe que não será impedido. Afinal, conhecem seu “eleitorado”. Sabem que, enquanto alguns têm medo, outros amam os privilégios. Hoje, não incomodamos mais: nossa cabeça não vale uma bala; nossa voz parece não ecoar. Lemos notícias, vemos telejornais, os fatos são escancarados, e o mesmo cinismo do outro lado. Ou de vários lados.

Neste momento, sentindo que os tempos voltam a lhe sorrir, a religião sente-se à vontade e impõe suas garras milenares. Vamos, de novo, ver proibições, cerceamentos, ilusionismos e ameaças? E tudo isso vai acontecendo num momento em que há general ameaçando com intervenção militar e gente letrada dizendo que “talvez não seja tão ruim”. É como um antigo filme que volta a passar em nossa mente. Será que a vida imitará a arte?

E, por falar em arte, um certo Caetano Veloso, no final dos últimos anos de chumbo, sugeriu que “a incompetente América Católica sempre precisará de ridículos tiranos”. Durante os últimos trinta anos, tentei acreditar que seus versos haviam caducado. Mas, acho que não...


https://www.youtube.com/watch?v=GR1MkCPf75k&feature=youtu.be


João Luiz Muzinatti

Setembro de 2017



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